terça-feira, 27 de dezembro de 2011

HISTORICO DA FAZENDA SANTAREM

A fazenda Santarem em Bemposta, distrito de Tres Rios no Rio de Janeiro, surgiu graças ao desmembramento de terras da fazenda Sant'Anna, localizada no distrito de Anta, pertencente ao municipio de Sapucaia, cuja sede já não existe, restando no local, apenas vestigios de seus alicerces. A antiga sede da fazenda Sant'Anna ficava situada na margem direita do rio Calçado que tem suas aguas ali fluindo em superficie lageada, fato que originou o nome do rio. A edificação da sede foi totalmente concluida no ano de 1813 pelo casal Damaso Jose de Carvalho e Magdalena Maria Pereira de Carvalho. Estes os pioneiros desbravadores desses sertões que tiveram origem em sesmarias concedidas pela coroa portuguesa ao capitão Antonio Barroso Pereira. O capitão era portugues oriundo de Salto, da comarca de Chaves,PT; se instalara na região de Sebolas fundando a fazenda do Mato Grosso no ano de 1784. Ele era homem maduro e viera de Minas Gerais recem casado com a jovem Mariana Jacinta de Macedo, nascida na fazenda "Ribeirão dos Cavalos" em N.S. da Piedade do Rio Grande, São João del Rey. Ela era filha de Maria de Carvalho Duarte e José Rabello de Macedo, neta materna de Caetano de Carvalho Duarte e de Catarina de São José, pioneiros e donos da fazenda de São Miguel do Cajurú, São João del Rey.
Catarina era filha de Antonia da Graça, e sobrinha de Julha Maria e Helena Maria, as tres irmãs e famosas ilhôas de Minas Gerais, de acordo com a obra de José Guimarães. As terras da fazenda Santarem são oriundas da fazenda Sant'Anna, que por sua vez,teve origem em terras que eram originalmente pertencentes as da fazenda da Bemposta. Todas essas terras se encontram em sesmarias requeridas pelo capitão Antonio Barroso Pereira, que pleiteou uma parte em seu nome e outra em nome de sua esposa Mariana. Tais sesmarias abrangiam imensa área territorial da banda leste da freguesia da Paraiba, onde surgiria o "Caminho do Mar de Espanha". Atualmente conhecida como cidade de Paraiba do Sul, a antiga freguesia alcançou a condição de municipio no ano de 1834, tendo como um de seus fundadores, Antonio Barroso Pereira (1792-1864), que posteriormente receberia o titulo de 1º barão de Entre Rios. Ele era homonimo e unico filho do capitão Antonio e irmão de Magdalena Maria Pereira de carvalho (1879-1871).
O capitão Antonio havia dado baixa da carreira militar em Vila Rica no inicio da gestão de D. Rodrigo José de Menezes (depois conde de Cavalheiros), que veio de Portugal para governar a capitania de Minas no ano de 1781. O jovem governador era descendente dos condes de "Catanhede" e "Marialva", estes da poderosa familia Coutinho, uma das mais influentes no reino de Portugal.
Após denuncias que chegaram a Vila Rica dando conta de garimpos clandestinos proximo ao rio do Peixe, afluente do Paraibuna, o governador tomou a iniciativa de mandar lavrar alvarás de posse de terras na região e ocupar a área, incorporando tributos à coroa. Isso ficou a cargo do corregedor Luis Beltrão de Gouveia e Almeida, que lavrou os primeiros alvarás de terra na região, antes mesmo do conhecimento de D. Martinho de Mello e Castro, então ministro do "Concelho Ultramarino" na Metropole.
Luis Beltrão seria mais tarde fiscal dos negócios de diamantes da coroa no Tijuco, atual municipio de Diamantina em Minas Gerais. Isso ocorreu de fato a partir do ano de 1785 quando assumiu o posto de 8º Intendente dos Negócios de Diamantes da coroa, um contemporaneo seu da Universidade de Coimbra. Tratava-se do desembargador Antonio Barroso Pereira, que viera de Portugal por nomeação de D. Maria I para ser fiscal de extração de diamantes em Vila do Principe, depois Serro do Frio. O desembargador Antonio era sobrinho, afilhado e homonimo do capitão Antonio Barroso Pereira, que era irmão de João Barroso Pereira, desembargador do tribunal da Relação da cidade do Pôrto, e pai do 8º Intendente.
Diante da grande amizade entre ambos, Luis Beltrão acabou por se tornar padrinho de Luis, o primeiro filho do desembargador Antonio. O menino que recebeu o nome do padrinho, foi batizado na capela de Santo Antonio do Tijuco no ano de 1785.
Luis Barroso Pereira se tornaria o mais celebre oficial da marinha imperial brasileira, formado na Real Academia de Marinha de Lisboa, com passagem pela Real Academia Naval Britanica. Ele notabilizou-se no rio Tejo sob o comando de Arthur Wellesley - futuro Duque de Wellington - na longa batalha de Santarem no ano de 1811 contra as tropas de Napoleão Bonaparte. O bravo oficial teria popsteriormente destacada participação na expulsão da esquadra de Portugal de aguas brasileiras durante as guerras da independencia, quando era imediato da fragata Nicteroy sob o comando do capitão Jhon Taylor.
Luis era interprete de Taylor e foi habil negociador no episódio da "Confederação do Equador" em Pernabuco no ano de 1824, quando por reconhecimento, recebeu de D. Pedro I a "Ordem do Cruzeiro".
Sua ultima atuação como notavel oficial da armada imperial brasileira ocorreu durante o ataque de uma esquadra Argentina comandada pelo alte. Williann Brown no ano de 1826. Luis Barroso Pereira era então capitão de Mar e Guerra e comandante da Fragata "Imperatriz Leopoldina" que se encontrava fundeada no porto de Montevideo. Apesar do ataque de seis navios inimigos, a Imperatriz resistiu de forma notavel, surpreendendo e repelindo a esquadra inimiga. Apesar de sua ousada tatica de contra-ataque, Luis pereceria da mesma forma que seu mestre "Nelson" em "Trafalgar", venceu e perdeu a vida no conflito.
Não por coincidencia, surgiu na ocasião, a famosa marcha atribuida a D. Pedro I, que se tornaria o hino da independencia do Brasil.
Dentre seus discipulos, há destaque para o marques de Tamandaré,portugues que se notabilizaria na guerra do Paraguay; que fôra seu tenente ao tempo da fragata Nicteroy. A primeira participação de Luis Barroso Pereira em combate ficaria mais tarde registrada por seu primo Mariano José Barroso de Carvalho, que denominaria de Santarem, sua bela fazenda de café em Bemposta. Mesmo falecido quatro anos após a independencia do Brasil, Luis Barroso Pereira teria sua notavel carreira lembrada por muitos anos. ele teve sua biografia registrada bem mais tarde, em tocante biografia escrita pelo barão do Rio Branco.
Com a morte do capitão Antonio Barroso Pereira, sua jovem viuva veio a se casar com José Antonio Barbosa, nascido na fazenda Sebolas, na freguesia da Paraiba. Este ficaria conhecido mais tarde como capitão "Tira Morros", alcunha ofertada por D. João ainda regente, e residente no Brasil, que se tornara a capital do reino a partir de 1808.
Por volta de 1804, o capitão José Antonio Barbosa daria inicio a ocupação das terras da banda leste da Paraiba que haviam sido requeridas pelo finado marido de Mariana Jacinta. É louvavel lembrar que, para receber tantas terras, o capitão Antonio Barroso Pereira, alem de seus atributos familiares junto à coroa, teve certamente, a participação efetiva do compadre e amigo de seu sobrinho homonimo aqui já citado Luis Beltrão de Gouveia e Almeida. Na ocasião da concessão, luis Beltrão era chefe do "Conselho Ultramarino" no Rio de Janeiro, órgão administrativo maximo do reino na colonia. A concessão de sesmarias passava inexoravelmente pelo crivo do conselho...
O capitão Antonio Barroso Pereira era oriundo de Santa Maria do Salto, um histórico lugar em Portugal, de onde Barrosos e Pereiras descendem dos mais antigos e ricos propritarios de terras daquele reino absolutista e essencialmente partrimonialista. De Salto eram oriundos os ancestrais de todos os Duques de Bragança, inclusive, o regente D. João, um legitimo descendente de D. Nuno Alvares Pereira e sua mulher e prima Leonor Alvim Barroso. Desse modo, é possivel compreender porque José Antonio Barbosa na condição de marido da viuva do capitão Antonio Barroso Pereira, teve a posse de tão vasto territorio. Por isso mesmo, após o falecimento de Mariana Jacinta no ano de 1833, a maior parte das melhores terras da Bemposta couberam a Magdalena Maria e seu irmão Antonio Barroso Pereira, restando uma pequena parte no alto da serra do Mundo Novo aos dois herdeiros que o capitão Tira Morros tivera em solteiro.
Com o desmembramento natural das terras da fazenda Bemposta, cuja sede foi erguida no ano de 1805, e da qual a fazenda Sant'Anna foi a primeira a ser desmembrada, todas as demais foram surgindo sucessivamente dessas duas durante o inicio do período cafeeiro.
A fazenda de Santarém teve sua sede edificada depois de 1840, quando do enlace entre Mariano José Barroso de Carvalho e Isabel leopoldina dos Santos Werneck. Ele recebeu as terras - desmembradas da fazenda Sant'Anna - de sua mãe Magdalena Maria Pereira de Carvalho, já viuva do alferes Damaso José de Carvalho desde 1832. Oficialmente as obras da sede da historica fazenda de Santarem foram finalizadas no ano de 1851.
Sua ampla sala de espera possuia inicialmente, magníficos afrescos com cenas de guerra, que lembravam cenas do conflito da "Batalha de Santarem" em Portugal por volta de 1811. Na sala de jantar, os afrescos eram de paisagens da fauna e flora, com cenas suaves de inumeros passaros e outros animais silvestres. Na fazenda Santarem nasceu José Antonio Werneck de Carvalho o primeiro filho do casal. Isabel Leopoldina ficou viuva aos cinco meses de gravidez do seu segundo filho Antonio José, que nasceria na fazenda Boa União em Entre Rios, pertencente à sogra Magdalena Maria. Isabel Leopoldina se casou depois com o cunhado Antonio José Barroso de Carvalho - por interferencia dos cunhados, o visconde e a viscondessa do Rio Novo - e tiveram os filhos, Deolinda, Magdalena, Anna, Josino Antonio, Damaso José, Guilherme José e Verginia. Isabel Leopoldina era filha de Antonio Luis dos Santos Werneck, que paulatinamente foi adquirindo terras por desmembramento da fazenda Sant'Anna, após ter adquirido a terça parte da metade da fazenda Bemposta, que coubera ao irmão de Magdalena Maria. Antonio Luis já havia edificado a sua primeira fazenda a qual denominara Boa Vista. Desta ele desmembraria as terras das fazendas Castelo e Recreio, brindadas aos filhos José Francisco - o mais velho e fundador do futuro distrito de N.S. da Conceição da Bemposta - e Luisa Maria respectivamente. Antonio Luis continuaria a arrendar e adquirir outras terras alem do morro de Sant'Anna em Bemposta, desse modo, tornar-se ia um dos maiores produtores de café de sua época. Com o tempo foi distribuindo suas terras aos filhos e sobrinhos que se casavam entre si, desse modo, apareceram as demais sedes de fazendas da bacia do rio Calçado, como, Cataguá, Retiro, Paciencia, Olaria e Santa Juliana. A ultima, viria a ser adquirida e edificada por e Luis Vieira Machado, irmão de Anna Maria da Assumpção,a esposa de Antonio Luis dos Santos Werneck. O vale do rio Calçado, desse modo, foi colonizado por Magdalena Maria Pereira de Carvalho inicialmente, seguida por Antonio Luis dos Santos Werneck - que lhe adquiria paulatinamente terras desmembradas da pioneira Sant'Anna - do cunhado deste, Luis Vieira Machado, assim como, de Guilherme de Araujo Franco, seu primo, que no alto Calçado, edificou a fazenda Bela Esperança. Houve ainda João de Sousa Werneck - primo irmão germanico de Antonio Luis - que edificou a fazenda Belem, tambem no alto Calçado. A fazenda Aguas Claras, na margem direita do Rio Preto, tambem foi edificada pela familia Araújo Franco após a guerra do Paraguay. As demais que surgiram, foram sendo edificadas pelos filhos dos pioneiros, ou seja, as denominadas fazendas de segunda e terceira geração, como Mundo novo, Harmonia, Aliança,Floresta, São Sebastião, São Joaquim, Cruzeiro e São João.
Após o falecimento de Antonio José Barroso de Carvalho, Isabel leopoldina foi morar com a filha Magdalena que residia com o marido Nicolau Antonio dos Passos na fazenda "Cruz das Piteiras", proxima ao atual distrito de Inconfidencia. Nicolau era irmão do marido de sua cunhada Anna, que era homonimo do pai, o comendador Joaquim Antonio dos Passos, dono da fazenda Santa'Anna do Alto do Pegado em Secretario. O comendador Joaquim exportava seu café diretamente de seus trapiches no porto do Rio de Janeiro. Homem riquissimo, ele edificou o magnífico palacete da av. Koeller em Petropolis, onde atualmente funciona o Hotel Solar do Imperio.
Após a morte do pai, Damaso José Werneck de Carvalho vendeu a fazenda da Aliança, onde nasceram suas duas primeiras filhas, Elazir e Octaline. Após entendimento com a mãe e seus irmãos _ frutos dos dois casamentos de sua mãe - Damasinho se tornaria o 3º senhor da fazenda Santarém. Ali com sua bela Francisca Augusta Rangel da Silveira (Chiquinha), teriam o unico filho Alynthor, e as filhas Irisval e Ulzimar. Chiquinha era amiga de outra e famosa homonima, a "Chiquinha Gonzaga". Elas se conheceram em um conservatório de musica na rua São Francisco Xavier no Rio de Janeiro, próximo de onde a outra veio residir com o pai Tristão Eugenio Crispiniano da Silveira Gomes e irmãos, após o falecimento da mãe Candida Augusta Rangel de Azeredo Coutinho. No conservatório se iniciara a amizade e a posterior parceria que seria interrompida com a morte tragica de Chiquinha na fazenda de Santarem por complicações com uma gravidez no ano de 1896.
Com o falecimento de Chiquinha, toda a musicalidade e explendor de Santarem se foi. Sua irmã Candida Augusta, mais conhecida como Candinha passou a cuidar dos sobrinhos como se mãe deles fosse. Apesar de comprometida, ela renunciara ao noivado para criar seus sobrinhos.
Irisval, minha avó, antes de iniciar sua trajetoria no colegio Santa Isabel em Petrópolis, foi alfabetizada na fazenda por Albina Teresa Marques de Abreu. Esta inesquecivel preceptora, que era irmã caçula do poeta Casemiro de Abreu, tambem lecionava francês e piano as filhas de Damasinho e Chiquinha. Ela foi apresentada a Damasinho, por seu cunhado Evaristo da Costa Cabral, marido de Deolinda. Os anos se passaram e depois de quase todos filhos casados, Candinha finalmente aceitou casamento de conveniencia com Damaso José, que dessa forma, acreditava deixar amparada a cunhada e tambem evitar a venda da fazenda, apesar de todas as crises que a cultura cafeeira enfrentava de forma cronica.
De problemas cardiacos Damasinho faleceria no ano de 1916, ficando Candinha com metade da fazenda e o restante para os filhos.
A contragosto paterno, Octaline se casara com o primo materno Edgard Silveira de Sousa, que adquiriu as partes dos cunhados, exceto da tia Candinha que era irmã de sua mãe Ambrosina Augusta e lhe passara sua metade.
Dividindo-se entre Petropolis e a fazenda de Santarem, Edgard resolveu vender a propriedade após a constatação do quadro de leucemia da esposa. Nessa ocasião, surgiu como intermediario na transação, um dos filhos de Elazir, que ambicionava a fazenda. Ele foi empregado na Companhia America Fabril atraves - do marido de sua tia Irisval - de Paulo Venancio da Rocha Vianna, procurador geral daquela que era a maior industria textil do mundo. Paulo era terceiro acionista, amigo e sócio de Demócrito Seabra, que detinha o controle acionário da companhia.
Flavio Damaso de Carvalho Werneck vislumbrava a possibilidade de realizar o negocio da venda da fazenda para Antonio Lartigaut Seabra, irmão de Demócrito. Após grande insistencia de Flavio, o negocio foi realizado, tendo ele se tornado administrador da fazenda de Santarem; abandonado o emprego na companhia America Fabril.
Com prejuizos acumulados rapidamente, Antonio L. Seabra descontente, acabou por aceitar vender a fazenda por nova insistencia de Flavio, que a adquiriu em "interminaveis" prestações.
Para pagar a fazenda, Flavio demarcou e desmembrou parte da mesma de modo a sinalisar o pagamento. A parte desmembrada incluia a antiga venda - e agencia dos Correios - da fazenda, que foi adquirida por Fritz Born por influencia do proprio Flavio Werneck, que o conhecera no tempo em que residiu no Rio de Janeiro. Fritz era cunhado de Laïta, prima de Flavio e filha de Paulo Venancio da Rocha Vianna e Irisval Werneck de Carvalho Vianna.
Em pouco tempo, no ano de 1950, Fritz desiste de sua parte da fazenda Santarem, mas a vende a Rodolpho Born Jr, seu irmão; marido de Laïta. Tal fato desagradou profundamente a Flavio, que dava como certa a reintegração da posse daquela parte preciosa da fazenda oportunamente.
Mais de duas decadas se passaram, até que, após a morte de Flavio Damaso de Carvalho Werneck, sua viuva e filhos, venderam a fazenda de Santarem para o empresário carioca Olavo Egydio Monteiro de Carvalho. Este posteriormente adquiriu as fazendas Harmonia e Floresta - outrora herdadas e edificadas pelos irmãos Antonio José e Guilherme José Werneck de Carvalho respectivamente -, cujas terras, haviam sido pertencentes à pioneira fazenda Sant'Anna. Nota. O morro de Sant'Anna em Bemposta ficou conhecido como tal, por ser citado naturalmente pelas pessoas, que desse modo, faziam alusão o local onde começavam as terras dessa fazenda, desde 1834, quando as terras da fazenda da Bemposta foram divididas entre os irmãos Antonio Barroso Pereira e Magadalena Maria. O morro de Sant'Anna fica defronte - a não mais existente - sede da fazenda Santa Juliana e servia de rumo com a fazenda do Recreio, cujas terras haviam sido desmembradas da fazenda da Boa Vista, a pioneira de Antonio Luis dos Santos Werneck em Bemposta. Ambas foram retratadas pelo famoso pintor bávaro Johann Georg Grimm, que pintou ainda em oleo sobre tela, as fazendas: Santarem, Retiro, Cataguá, Belém, Bela Esperança, Aliança e Floresta, todas na bacia do rio Calçado.

segunda-feira, 12 de setembro de 2011

A ocupação do vale do rio calçado

O rio Calçado surge na serra do Capim exatamente entre os atuais municipios de Sapucaia, Sumidouro, Teresópolis, Tres Rios e São José do Vale do Rio Preto. Suas águas descem caprichosamente as faldas opostas das serras que separam as águas dos rios Preto a oeste e Paquequer a leste. Paulatinamente elas correm numa interminavel sequencia de curvas, sempre banhando os contrafortes e várzeas que vão surgindo desde seu terço mais alto, trazendo aluvião durante as cheias; espalhando a preciosa matéria fertil pelas várzeas que banha até sua foz, onde desagua diretamente no rio Paraiba do Sul.
O alto Calçado separa os municípios de Sapucaia e São José do Vale do Rio Preto, assim como, Sapucaia e Tres Rios desde o seu terço médio até a foz. Sua bacia era reduto de segmento de tribos Purys e somente recebe o elemento europeu a partir do séc. XVIII, quando os mesmos possivelmente utilizaram as trilhas desses nativos com o propósito de burlar os "Registros" - de Paraibuna em MG e Pampulha em Sebolas, RJ - ao longo do "Caminho Novo". Desse modo, contrabandeavam o ouro trazido de Minas Gerais, atravesando a zona da mata passando pelo "Arraial do Cágado" - atual município de Mar de Espanha- e depois Chiador, por onde atravessavam o rio Paraiba do Sul no local conhecido como Porto Velho. Já em terras fluminenses, na margem direita do Paraiba, seguindo o ribeirão da Grama em sentido sudeste, subiam a serra da Arataca, onde no primeiro contraforte após um altiplano faziam pouso para descanço e preces ao pé da imagem de Santo Antonio. Naturalmente que o contrabando do ouro só poderia ter sequencia nesse determinado ponto próximo ao "Caminho do Mar de Espanha", que obviamente receberia tal denominação bem posteriormente. É certo, que os primeiros caminhos surgiam a partir das trilhas que os próprios indios utilizavam, invariavelmente entre os rios e as áreas mais elevadas que habitavam para cultivo da mandioca especialmente; fora do alcance das cheias.
Curiosamente com a imagem de Santo Antonio sempre renovada, o local de reza, existe desde tempos remotos segundo a antiga tradição local. Tão verdadeiro é o fato, que anualmente, do mesmo modo, é celebrada a festa secular de Santo Antonio, o legítimo padroeiro do lugar, que tem essa denominação e pertence a Anta, 2º distrito do atual municipio de Sapucaia. Tal municipio surgiria somente após decreto provincial de 25 de fevereiro 1885, recebendo a denominação de Santo Antonio da Sapucaia, justamente devido a antiga tradição. É importante ressaltar, que a "Vila de Anta" já era povoada no ano de 1834, quando Gardner relata a construção de uma ponte de madeira na travessia do Paraiba, no local da atual de concreto existente entre Minas Gerais e Sapucaia no Rio de Janeiro. O autor britânico menciona que existiam apenas ali naquele sertão, umas quatro casinhas habitadas pelos operarios que edificavam a ponte que levava à fazenda do Louriçal, onde se hospedara em terras mineiras. Fica compreensivel que a ocupação do território leste da Paraiba se deu a partir de Santo Antonio, o local de culto antigo próximo à margem do "Caminho do Mar de Espanha". O atalho seria utilizado na primeira década do séc. XIX por Magdalena Maria Pereira, que ao tomar posse de sua parte na partilha da fazenda da Bemposta, edificaria a fazenda Sant,Anna. Após a travessia do local de culto e da serra da Arataca, Magdalena Maria e Damaso José de Carvalho resolveram edificar a sede próxima a uma área vastamente lageada do rio, que por isso mesmo, foi denominado Calçado. Concluida no ano de 1813, a fazenda recebeu a denominação em homenagem a Sant'Anna de Sebolas, onde Magdalena Maria fôra batizada no ano de 1789, assim como, seu irmão Antonio Barroso Pereira (1º barão de Entre Rios), em 1792.
Após a edificação da fazenda Sant,Anna e a ocupação de suas terras, Magdalena Maria edificaria a primeira capela de Sant'Anna no local onde se desenvolveria o arraial e posteriormente a vila de Anta. Nas terras da "BarraD'antas", fazenda que couberia ao filho caçula Damaso José Barroso de Carvalho Jr, teve origem o nome da vila, atualmente 2º distrito de Sapucaia. Na tradição oral familiar, consta que D. Pedro II certa vez, hospede de Damaso Barroso de Carvalho Jr, se apaixorara pela vista da barra do alto da colina. No local, o imperador do Brasil mandaria edificar a graciosa sede em forma de cruzeiro, desse modo, demostraria a gratidão pela hospitalidade; ficaria mais a vontade para fazer uso da residencia sempre que desejasse. Ali ele descançou por algumas vezes, especialmente em suas andanças por, Porto Novo, Cataguases, Leopoldina, Carmo, Cantagalo, etc. A pequena sede resiste ao tempo e ao descaso com sua conservação, e ainda ostenta a escadaria em pedras brutas de granito, que ofereçe acesso desde a colina à linha do trem, pouco antes da estação de Anta. A escadaria presente reforça a tese de que ali naquele exato local, o trem com a comitiva real fazia sua parada fora do ponto oficial da estação, desse modo, oferecendo acesso direto à residencia.
Após a edificação da fazenda Sant'Anna do Calçado, que teve inicio no ano de 1820 nas terras altas do histórico rio, a fazenda Sant'Anna sofreria inumeros desmembramentos. Isso veio a ocorrer devido ao falecimento no ano de 1832 de Damaso José, marido de Magdalena Maria. Proprietária das fazendas Boa União e Piracema em entre Rios, alem de interessada na Mato Grosso fundada por seu pai, Magdalena Maria dividiria grande parte das terras de Sant'Anna entre seus filhos, alem de arrendar outras grandes áreas para cultivo de café. A sede coube ao filho Antonio José Barroso de Carvalho, que mais tarde, desmembraria terras para seus tres filhos Homens.
Por volta de 1840, houve o desmembramento de pouco mais de 100 alqueires de terra, que Magdalena Maria presenteou o filho Mariano José Barroso de Carvalho, por seu casamento com Isabel Leopoldina dos Santos Werneck, filha de seu leal parceiro Antonio Luis dos Santos Werneck. Desse modo, surgiu a segunda fazenda genuinamente de café do vale do rio Calçado que recebeu a denominação de Santarém. A denominação foi uma singela homenagem ao primo de Mariano José que se notabilizara na batalha de Santarém em Portugal no ano de1811 contra as tropas de Napoleão Bonaparte. Luis Barroso Pereira, o intrépido brasileiro que comandara as terriveis canhoneiras que destruiam seguidamente a ponte sobre barcos que os franceses obstinadamente tentavam construir no rio Tejo. Luis faleceu tragicamente no ano de 1826 no comando da fragata Imperatriz então fundeada no porto de Montevideo, atacada por uma esquadra argentina comandada pelo alte. Willian Brown durante as guerras da banda oriental. A morte do lendário oficial da armada imperial, que se formara na Real Academia de Lisboa, com passagem pela Real Academia Britanica; ex comandado de Wellington na batalha de Santarém, enlutara não somente a familia, mas a todo imperio brasileiro. A biografia de Luis Barroso Pereira foi escrita pelo barão do Rio Branco, cuja geração, ainda alcançou a repercussão do mais prodigioso oficial e diplomata da real armada do império do Brasil. Luis, recebeuo nome de seu padrinho de batismo Luis Beltrão de Gouveia e Almeida ao ser ungido com os santos oleos na matriz de Santo Antonio do Tijuco no ano de 1785, quando seu pai exercia o cargo de 8º Intendente dos Negócios de Diamantes da rainha D. Maria I de Portugal.
Após o desmembramento da fazenda Santarém, N.S. da Conceição da Bemposta surgia como vila, fundada por José Francisco dos Santos Werneck, irmão mais velho de Isabel Leopoldina. Nessa ocasião ocorreram varios desmembramentos da fazenda Sant'Anna em beneficio de Antonio Luis dos Santos Werneck, que atuando como meeiro, pagava suas terras com o produto das lavouras de café. Surgiram desse modo, as fazendas Cataguá e Retiro quase simultaneamente, sendo que a primeira teve sede edificada por Fernando Luis dos Santos Werneck, irmão de Isabel Leopoldina, que era casado com sua prima irmã Galdina do Carmo, filha de Luis Barbosa dos Santos Werneck. A fazenda do Retiro foi edificada por Manoel Luis dos Santos Werneck, filho mais velho de Fernando Luis dos Santos Werneck, que por sua vez era padrinho de seu sobrinho homônimo proprietario da fazenda do Cataguá. Manoel Luis dos Santos Werneck casou com Maria Delphina Passos, filha de Ana Maria da Assumpção, que uma vez viúva de Joaquim Machado, casou com Antonio Luis dos Santos Werneck. Ana Maria era filha primogenita do segundo casamento de Antonio Vieira Machado, fazendeiro em Sacra Familia do Tinguá, contemporaneo do capitão Antonio Luis dos Santos que foi pai de Antonio Luis dos Santos Werneck. Antonio Vieira Machado, foi sogro ainda de Luis Barbosa dos Santos Werrneck e Francisco Luis dos Santos Werneck, ambos filhos do capitão Antonio Luis dos Santos.
Antes do inicio da guerra do Paraguay, várias outras fazendas foram sendo edificadas por filhos e sobrinhos de Antonio Luis dos Santos Werneck. Desse modo, surgiram pela ordem, as fazendas Santa Juliana, Olaria e Paciencia. Por outro lado, terras da fazenda Boa Vista, que Antonio Luis dos Santos Werneck adquirira em 1837 do irmão de Magdalena Maria por desmembramento da fazenda da Bemposta, eram desmembradas. Surgiram desse modo, as fazendas do Castelo, erguida por José Francisco dos Santos Werneck, e posteriormente a fazenda do Recreio, edificada por Francisco Inácio dos Santos Werneck e Luisa Maria.Tanto José Francisco como Luisa Maria, eram filhos de Antonio Luis dos santos werneck. A fazenda Boa Vista coube a Inacio Barbosa dos Santos Werneck, que ao se casar com a prima Amélia, irmã de Francisco Inácio e Manoel Luis, alterou a denominação para fazenda Boa União. Após curto período, o futuro barão da Bemposta venderia a fazenda para seu primo Antonio Sousa Leite que era irmão de Augusto Sousa Leite, futuro barão de Águas Claras, que se tornaria proprietario da fazenda de mesma denominação situada em São José do Vale do Rio Preto.
A Fazenda das Águas Claras é da mesma época da fazenda Bela Esperança; ambas são posteriores a fazenda Belem erguida por João dos Santos Werneck, que era primo irmão germânico de Antonio Luis dos Santos Werneck. Estas tres ultimas tambem surgiram antes do inicio da Guerra do Paraguay, assim como a de Santa Cruz, edificada por Saturnino dos Santos Werneck, filho de João. Houve ainda a fazenda Santa Rita em Aparecida, que foi edificada no inicio de 1840 e que pertencia a parentes de Damaso José de Carvalho. Infelizmente a bela e magestosa sede foi posta abaixo por volta do ano 2000.
Muitos filhos desses fazendeiros e de seus proximos em Vassouras e Valença pereceriam no "Chaco Paraguaio" entre alguns escravos das mesmas fazendas. Durante e após a mais terrivel guerra de nossa historia, apareceriam as fazendas ditas de terceira geração, ou seja, a dos netos de Magdalena Maria. Na fase inicial do conflito, houveram ainda algumas edificações de certo requinte arquitetonico, como as fazendas São João, São Sebastião e Mundo Novo. Destas ultimas, resta apenas a São João, mas todas oriundas de desmembramento de terras de Sant,Anna.
Após a guerra do Paraguay, o Brasil empobrecido graças ao esforço de guerra, haveria outro fator internacional que provocaria grandes danos a denominada aristocracia rural cafeeira. A manipulação internacional do comercio de café com base na bosa de Londres, pois novos paises produtores entraram no mercado facilitando a manipulação do preço da saca. Tal situação iria trazer trágicas consequencias que tambem influenciariam no golpe militar de 1889, com a instauração da república. Muitos historiadores apontam a abolição como a principal causa, o que não passa de retórica, pois mesmo bem antes do golpe, havia extensa mão de obra importada, especialmente de Portugal. Muitos descendentes desses portugueses e açorianos tardios, vieram a utilizar a lei do usocapião e se tornaram proprietários de algumas dessas fazendas, estimulados pela politica demagogica de Ruy Barbosa. São exemplos dessa pratica, as fazendas Sant,Anna, Retiro, Harmonia, São João e São Sebastião entre outras.
As fazendas tardias como mencionado, foram aquelas de sedes de aspecto arquitetonico medíocre, reduzidas extensões de terras e todas edificadas após 1865. A fazenda da Aliança foi edificada por Damaso José Werneck de Carvalho, que posteriormente se tornaria 3º senhor da fazenda Santarém. A fazenda da Harmonia, foi o primeiro desses exemplos e edificada por Antonio José Werneck de Carvalho, que era o segundo filho de Mariano José e Isabel Leopoldina. Posteriormente, ele adquiriu de seus tios a fazenda Santa Juliana, mas os tres filhos que teve com Isabel Inacia do Nascimento Vieira, nasceram na fazenda da Harmonia. Foram eles: Arlinda, Evangelina e Celso Vieira Werneck de Carvalho. Na ocasião da mudaça para a fazenda Santa Juliana, Antonio José acatando o pedido da cunhada Francisca Augusta Silveira Werneck de Carvalho, cedeu a fazenda da Harmonia para o irmão desta, Eugenio Tristão Rangel da Silveira que habitava no Mosquital com mulher e muitos filhos pequenos e em condições precárias. Mosquital é um lugar inóspito que fica situado no alto do Cruzeiro, terra alta que pertencia a fazenda do Cataguá, onde residia Tristão Camara, sogro de Eugenio Tristão e feitor e agricultor de Fernando Luis dos Santos Werneck. A terceira filha de Tristão Camara teve como padrinhos os donos da fazenda do Cataguá, tendo recebido o nome da madrinha Galdina do Carmo. Mais tarde, Galdina do Carmo Camara, viria a se casar com Manoel Alves e seriam pais de Tristão Alves Camara, que por sua vez, contrairia matrimonio com Maria Emilia, filha de Emerenciana Augusta - irmã caçula de Francisca Augusta - exposa de Gustavo Lessa.
A fazenda da Floresta, do mesmo modo que Harmonia e Aliança, surgiu atraves do desmembramento de terras da Sant'Anna, que Antonio José Barroso de Carvalho doou ao filho Guilherme José Werneck de Carvalho. Mais tarde ele compraria de seu cunhado Nicolau Antonio dos Passos, a fazenda do Alto do Pegado em Secretário. A fazenda Sant'Anna coube ao outro filho Josino Antonio Werneck de Carvalho e daí a seus herdeiros, até que por usocapião fosse abocanhada por J. Moita de Assunção, portugues analfabeto que ali habitava. Verdadeiramente a crise do café no inicio do séc. XX, associada a política de Ruy Barbosa e o alto custo de manutenção das fazendas que passavam a pecuaria leiteira, alem dos problemas de desavenças entre herdeiros, colaboraram com apropriação das mesmas através da lei do uso do solo de 1842.
Durante a ditadura Vargas, a estrada Rio Bahia utilizaria a rota do Caminho do Mar de Espanha desde Bemposta, quando abandonava a estrada União e Industria que se dirigia à Juiz de Fora, e atingia Alem Paraiba - antiga Porto Novo do Cunha, denominação esta ofertada por Tiradentes - depois de passar por Anta e Sapucaia no Rio de Janeiro. Até essa ocasião, somente de trem, se atingia a villa de Anta, com parada anterior em Chiador e posterior em Sapucaia.